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Bitcoin e seus princípios

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Tudo o que você precisa sobre Bitcoin

Artigo de Guilherme Barbosa, selecionado através do Fluxo de Informação e Globalização da ShapeShift DAO em 28/11/2021.

Em meados de outubro de 2008 os Estados Unidos davam início a sua crise financeira mais grave desde a Grande Depressão ocorrida em 1929. Em análises realizadas por Ray Dalio em seu livro Big Debt Crises, o autor observou que a sua principal causa fora uma falha estrutural no mercado financeiro americano, tanto das instituições financeiras, quanto do governo americano. Isto ocorreu, principalmente, pela oferta excessiva de ativos supostamente de baixo risco e colaterizados, mas que na realidade eram maquiados por agências de risco. Além disso, por este mercado tornar-se rentável para muitos investidores nos EUA, construiu-se um lobby para manter-se um setor com baixa regulação. A estes, deu-se o nome de CDO – Collateral Debt Obligation -¹.

Estes ativos representam dívidas contraídas decorrentes de empréstimos realizados e sua oferta no mercado iniciou-se em 1987 no banco de investimentos Drexel Burnham Lambert. Os criadores dos CDOs consideravam estes ativos um “lixo”, devido ao alto risco de inadimplências dos mutuários. No entanto, ao longo dos anos a demanda pela aquisição de CDOs aumentou e todos os bancos começaram a oferecer a investidores este produto, como JP Morgan, Morgan Stanleys e Lehman Brothers. A alta demanda por empréstimos estudantis e o boom do mercado imobiliário americano acarretou num aumento na comercialização de CDOs de alto risco.

No entanto, em razão dos altos lucros obtidos com este ativo, bancos, agências de risco e o próprio governo não se preocupavam com o risco da bolha deste mercado. Enquanto os bancos reuniam empréstimos de alto risco, as agências de avaliação atribuíam notas máximas aos CDOs – denominados como triple A – e o governo, tomado pelo lobby bancário, buscava não regular este segmento.

As consequências destes atos foram vistas e divulgadas pela mídia: a falta de critérios para concessão de empréstimos visando apenas os lucros causou uma alta inadimplência no pagamento destes, ocasionando não só a insolvência dos bancos responsáveis pelo loop de empréstimos sem critérios, mas afetando negativamente a economia de maneira global.

Fonte: Exame

Recomendamos aos interessados no estudo da crise de 2008 o filme "A Grande Aposta" e o documentário da HBO "Panic: The Untold Story of the 2008 Financial Crisis"

Em paralelo a bolha dos subprimes em 2008, o Bitcoin dava seus primeiros passos, tendo sido registrado o seu domínio bitcoin.org em Março de 2008 e, no dia 31 de outubro deste ano, o lançamento do seu white paper. Satoshi Nakamoto, seu anônimo criador, descreve claramente que a criação do Bitcoin é fundamentada na ausência de confiança nas instituições financeiras e governamentais atuais. Como observa-se em leitura ao white paper:

O que é preciso é um sistema de pagamentos eletrônico baseado na prova de criptografia ao invés de confiança, permitindo a duas partes transacionar diretamente uma com a outra sem a necessidade de confiar em um intermediário

Assim, o objetivo principal era a criação de uma nova moeda utilizada como meio de pagamento, de modo que as transações efetuadas utilizando BTC, poderiam ser verificadas sem a necessidade de um intermediário para garantir a veracidade das informações contidas nelas.

Para conseguir este feito, Satoshi desenvolveu o que seria o primeiro tipo de DLT já criado, a blockchain. Falamos sobre seus principais conceitos em outros artigos. A blockchain pode ser definida como uma tecnologia de armazenamento distribuído, onde a informação das transações realizadas pelos usuários ficam guardadas em blocos, sendo organizadas em uma corrente concatenada. Essa lógica, é utilizada para garantir a veracidade das informações introduzidas pelos usuários, uma vez que os blocos são linkados através de hashs.

Abaixo vê-se representação gráfica de todos os dados contidos dentro de um bloco. Ele é divido em duas partes: o cabeçalho e a lista de transações.

Informações contidas dentro de um bloco na blockchain do Bitcoin. Fonte: Marcsteiner

Porém, para introduzir novas informações na corrente de blocos - blockchain - é necessário um consenso entre todos os responsáveis pela validação e introdução de novas informações na rede.

Esse consenso, na blockchain do Bitcoin, é formado a partir da Prova de Trabalho ou Proof of Work - PoW -.

A prova de trabalho , foi concebida por Cynthia Dwork e Moni Naor com o objetivo de combater os junk mails ou spams — um grande problema na época da explosão do uso de e-mails. Esta concepção foi, tempos depois, adotada por Adam Back em seu projeto Hashcash.

O Hashcash aplicava a teoria criada pelas pesquisadoras a um sistema que visava combater spammers, tornando o envio de e-mails em escala, economicamente inviáveis. Isso deu-se através da criação da Prova de Trabalho: o usuário que detinha a intenção de enviar uma mensagem a outro, necessitava solucionar quebra-cabeças criptográficos.

Estes quebra-cabeças a serem resolvidos, eram criados a partir dos metadados — emissor e receptor da mensagem, por exemplo — presentes no e-mail, junto de números aleatórios. A partir desta combinação, o sistema transformava-os em números binários e, logo após, num hash contendo as mesmas informações. Constituindo-o, a máquina do usuário necessitava encontrar este hash correspondente criado pelo sistema de e-mail, apontando aleatoriamente até alcançar o resultado correto. Devido à infinidade de resultados possíveis, o usuário demandava gasto de poder computacional para solucionar o problema criado pelo sistema, embutindo dificuldade no envio do e-mail e dificultando o envio de mensagens em massa, por esta obrigar àquele que possui o desejo de enviar muitos e-mails de spam deter larga capacidade computacional para tal. Esta maneira de localizar um resultado é chamado de força bruta.

Com o uso deste algoritmo a Prova de Trabalho demonstrou-se mecanismo eficaz para a formação do consenso na rede do Bitcoin. A intenção de seu criador foi a mesma de Adam Back: afastar usuários maliciosos, inviabilizando seu uso com intenções de fraudar a rede.

Aplicando o Proof of Work ao Bitcoin, Satoshi desenvolveu uma forma de a atividade fraudulenta ter uma lucratividade menor frente as recompensas obtidas por torná-la segura.

Isso acontece, em função do gasto computacional para alterar informações da rede ser extremamente alto, devido ao grande número de validadores em atividade na rede. Pelo contrário, caso sua força de processamento de dados seja direcionada para incluir novas informações nos blocos ou validar as inseridas por outros nós, acaba por ter como recompensa a moeda nativa da rede, BTC, somado as taxas pagas pelos usuários que efetuaram as transações.

Além da segurança da infraestrutura do Bitcoin, todas as informações incluídas em sua rede são públicas, imutáveis e não há uma autoridade central com o controle dos participantes na blockchain.

Todas as características intrínsecas a blockchain do Bitcoin são claramente uma contraposição ao sistema financeiro tradicional. Sua busca por (1) não identificar os usuários participantes na rede; (2) manter todos os registros armazenados ad eternum para qualquer pessoa ver; (3) e, ainda que as transações sejam comprovadamente relacionadas a atividades ilegais, não existir ninguém que possa alterá-las demonstra que o Bitcoin não é somente mais uma ferramenta para transacionar valores digitalmente, mas sim um manifesto político tão importante quanto o Manifesto Cypherpunk escrito por Eric Hughes, clamando por privacidade no começo dos anos 90.

Desde sua concepção, o Bitcoin foi recorrentemente associado a lavagem de dinheiro, crimes financeiro, tráfico de drogas e até mesmo aquecimento global. Pouco a pouco, todas as alegações negativas vão sendo empiricamente derrubadas, guiadas não por apenas pela ausência de crença no Estado, mas pela eficiência da tecnologia desenvolvida por Satoshi Nakamoto.

¹CDO ou Obrigação de Dívida Colaterizada é uma maneira encontrada por instituições financeiras para securitizar dívidas em seu favor. Desse modo, um empréstimo concedido a terceiro garantido por um ativo – por exemplo - pode ser convertido em títulos que darão direito ao recebimento no pagamento da dívida com juros.